12 de abr. de 2009

Iron Maiden - A odisséia


Agora vou relatar o esforço épico que foi empreendido para assistir ao show do Iron Maiden na turnê Somewhere Back In Time Tour aqui em São Paulo. Acredito que a aventura não deixa a dever em nada para empreitadas heróicas e lendárias como descritas em livros como Ilíada, A Odisséia e mesmo as Lusíadas.


Prólogo - A chuva

Não obstante inventarem um show num lugar muito, mas muito longe de tudo o que conhecemos como civilização aqui em São Paulo - o autódromo de Interlagos -, ainda tiveram a idéia brilhante de organizá-lo em um domingo, sendo que no dia seguinte a maior parte do povo teria que estar cedo no trabalho para pegar no batente. Ponto negativo para a organização.

Bem, eu estava me preparando para sair por volta de 16 horas da tarde (o show estava marcado para começar às 20 horas), pois achei que daria tempo de pegar o trem e ainda assistir à atração que faria a abertura, o Shadowside. Para minha (in) felicidade, começou a cair uma chuva monstruosa sobre a cidade. Naturalmente que eu não ia sair na chuva, portanto tive que esperá-la passar ou, ao menos, diminuir. Ainda bem que não choveu por muito tempo. Porém, o temporal obrigou-me a rever meu equipamento, e levei uma mochila com guarda-chuva, capa de chuva e outras coisinhas básicas.

Parte 01 - A ida

Para quem mora na Zona Leste de São Paulo, chegar ao Autódromo de Interlagos, no extremo sul da cidade, é um verdadeiro parto. É necessário valer-se de todos os meios de transporte públicos disponíveis.

O primeiro passo era chegar ao metrô, e para isso era necessário tomar um ônibus. Essa foi a parte mais fácil da epopéia. Aqui perto de casa passam vários ônibus rumo às estações Belém, Tatuapé ou Carrão. Era só pegar o primeiro que passasse no ponto. Batata! Minha chegada ao ponto coincidiu com a do ônibus. Não tive nenhum problema nesse sentido. Após uns 20 minutos, aproximadamente, lá estava eu na Estação Tatuapé.

Estando no Tatuapé, a próxima etapa era relativamente tranqüila também. Bastava pegar o metrô até o final da linha Vermelha, que liga a Zona Leste a algum pedaço da Zona Oeste de São Paulo. A melhor parte é que não precisaria fazer baldeações nem coisas do gênero. Uma reta só! Logo, meu único trabalho foi me sentar e aguardar chegar ao destino final. Na Barra Funda, como ninguém é de ferro, aproveitei pra comer alguma coisinha.

Agora começava o desafio. Pegar o temido trem, que tanto espreme os paulistanos e habitantes dos arredores durante a semana. Nesse caso eu não teria como escapar da baldeação. Aí as coisas começaram a não ir tão bem. Eu estava descendo as escadas para pegar o trem que ia rumo a Itapevi e tive tempo de ver o trem partindo... ah, se eu tivesse deixado pra comer depois. Aproximadamente uns 15 minutos depois (o site da Companhia de Trens Metropolitanos diz que a espera em fim de semana nesse horário não passa de 10 minutos), chegou o trem seguinte. O bom de ser um fim-de-semana é que o trem seria menos lotado. Mas, por todos os céus, como é lerdo! Acho que se eu fosse de bicicleta paralelo à linha do trem teria chegado bem mais rápido.

Enfim, descendo na estação Presidente Altino da linha Diamante da CPTM - as linhas de trem aqui em São Paulo tem todas nomes de pedras preciosas, embora eu não saiba exatamente o porquê -, posicionei-me na outra plataforma para pegar a linha Esmeralda. Apesar de ser uma linha com mais carros modernos, eu não gosto dela porque o interior dos vagões é muito frio. Qual é a necessidade de colocar o ar-condicionado no módulo polar? E lá fui eu junto com o trem. O legal dessa linha é que boa parte dela desse praticamente paralela à Marginal Pinheiros. A parte ruim (muito ruim, por sinal) é que são nada menos que 14 estações até o Autódromo de Interlagos, naquela velocidade de trem de ferrorama.

A cada estação que passava, entravam mais e mais pessoas com camisetas do Iron Maiden. O bacana é que havia pessoas de todas as idades. Tinha gente com algumas camisetas desbotadas dos primeiros anos do Iron Maiden, ao passo que também via-se crianças vestindo as mais recentes, que promoviam justamente a Somewhere Back In Time Tour. Quem disse que o heavy metal não pode ser um programa de família?

Afinal, após 14 estações, desci na estação Autódromo da CPTM. Agora, o problema seria chegar no Autódromo propriamente dito, já que o mesmo, por algum motivo desconhecido, não é exatamente tão perto assim da estação à qual dá o nome.

Parte 2 - O local

Após dar umas voltas meio perdido e peguntar aqui e acolá sobre a localização, cheguei com relativa facilidade ao Autódromo de Interlagos. Eu subi uma rua que eu nem imagino como se chama que saiu de frente para o dito-cujo. Aliás, desde lá do começo da rua dava para ver as várias luzinhas vermelhas das viaturas policia is que certamente estavam providenciando a segurança da grande multidão ali presente.

Quando eu cheguei mais perto, descobri que a multidão era maior do que eu imaginava. A fila ao redor do autódromo se estendia para muito além do alcance dos meus olhos, tanto ao lado direito quanto para lado esquerdo. Como não havia lugar para pedir informações, escolhi aleatoriamente o lado direito e comecei a buscar o final da fila. Daí, andei, andei, contornei um quarteirão, dois quarteirões, e nada de ver o final da fila. Acho que andei uns 10 minutos e o fim da fila parecia simplesmente não existir.

Porém, nesse momento lembrei que estava com um ingresso para a pista premium na mão e raciocinei do seguinte modo: "Bem, talvez exista alguma entrada exclusiva para que tem esse ingresso". E lá fui eu na direção contrária, em direção à entrada do autódromo. Se eu estivesse errado e fosse uma fila única estaria ferrado, já que teria que voltar novamente e procurar o lendário final da fila. Acho que andei uns vinte minutos até encontrar a entrada do autódromo. Daí eu entendi o motivo de haver uma fila tão grande. A organização, do evento do alto de. uma competência absurda, disponibilizou apenas UM portão de entrada para um público estimado em pelo menos 60 mil pessoas. Para minha sorte, havia uma entrada reservada para a pista VIP. Ufa!

Ok! Atravessei o famigerado portão de acesso, depois passei pela rotineira verificação por parte dos seguranças do local e comecei a descer pela pista do autódromo. E andei bastante até um ponto em que o asfalto bifurcava em duas passagens, uma para a pista normal e outra em direção à pista premium, para a qual me dirigi. Depois, andando mais ainda, pelo menos uns cinco minutos. Haviam pessoas que, à revelia dos seguranças, encostavam nas limitações do caminho para fazer suas necessidades fisiológicas. Os seguranças gritavam "Ei! Tem banheiro lá na frente!", mas ninguém dava atenção.

Ao final, cheguei na famosa pista premium. Quando achei que finalmente os problemas haviam ficado para trás, percebi que estava em um pântano. O local destinado ao público era o terrão do autódromo, e com a chuva que eu mencionei no início da narrativa transformou-se em um lamaçal gigantesco. Eu arranjei um lugar e tentei permanecer parado o máximo possível. Eu não conseguia nem pular de tanto que meus pés estavam afundados na lama. Quando eu achei que não poderia me sujar mais, o pessoal passava de lá para cá pisando no meu pé. Afinal, por que as pessoas não conseguem ficar num lugar fixo em um show?

Parte 3 - A espera

A primeira coisa que eu descobri é que a espera seria mais longa do que imaginava. Primeiro, não haveria show do Shadowside. Com a chuva, todos os preparativos para o Maiden foram atrasados, de forma que não haveria tempo hábil para que houvesse uma atração de abertura. Só porque eu estava entusiasmado para assistir ao Shadowside.

Segundo, o show do próprio Iron Maiden iria atrasar. Não obstante todos os preparativos ainda estivessem sendo efetuados, o empresário da banda, Rod Smallwood, declarou que os integrantes decidiram retardar em pelo menos uma hora o início do show para que as (muitas) pessoas que aguardavam do lado de fora pudessem entrar. Pessoalmente nada contra, achei até muito bacana da parte deles. Seria injusto começar o show havendo tantos fãs que pagaram ingressos bem caros do lado de fora. Ponto para a banda.

63 mil pessoas segundo a (des) organização do evento
(Fonte: Whiplash)

Para compensar a espera haviam selecionado bastante músicas divertidas para tocarem nos PAs: "Highway Star", do Deep Purple, "Ace Of Spades", do Mötorhead, e "Another Thing Comin'", do Judas Priest. O interessante foi ver todo mundo aclamando a música "Doctor, Doctor" do UFO. A maioria achou que seria a entrada do Maiden no palco. Como começaram a gritar mesmo, o jeito foi continuar. É gratificante saber que ainda tem fãs de metal que sabem que o UFO existe.

Parte 4 - Scream For Me, São Paulo!

Às 21 horas em ponto (ou próximo disso), as luzes se apagam para que fosse projetado no telão as imagens de um documentário sobre a banda. Os telões tinham alguns riscos estranhos em determinadas partes, já que aparentemente foram um pouco danificados pela chuva. A seguir, a imagem foi trocada pelo discurso de Churchill proferido na Segunda Guerra Mundial. Pronto! Estava tudo preparado para a entrada da banda.

Bruce Dickinson comandando a festa
(Fonte: UOL)


E o Iron Maiden aportou com tudo no palco mandando ver com "Aces High". Bombástica, como sempre. O nanico Bruce Dickinson, com um gorrinho que o fazia parecer um duende, correndo para todos os lados como um retardado, teve a experiência de ver seus vocais serem encobertos pela cantoria do público presente. A sucessão de clássicos seguiu com "Wrathchild" e "2 Minutes To Midnight"

Todo o espetáculo ao vivo de um show do Maiden
(Fonte: Whiplash)

Finalmente Bruce Dickinson começou a falar com a platéia. Perguntou o motivo da "fucking rain" ter caído em São Paulo justamente no verão, pediu desculpas pelo atraso do show e agradeceu a presença de um público que, segundo o vocalista, seria o maior da história do Iron Maiden (sem considerar festivais, claro). Ele também saudou o pessoal que tinha se acomodado em um morrinho à esquerda do palco (direita da banda).

Um show de luzes e fogos
(Fonte: Sei lá)

Após o falatório, "Children Of The Damned" foi apresentada ao público como uma música não tocada há muito tempo. Adrian Smith mostrou do que é feito um bom guitarrista e detonou ao lado de Bruce Dickinson. De tempos em tempos, no meio das músicas, Bruce entoava sua clássica frase "Scream For Me, São Paulo", onde era prontamente atendido.

A chefia Steve Harris, um dos grandes nomes do heavy metal
(Fonte: Iron Maiden Brasil)


A seguir, outro clássico eterno do Maiden, "Phantom Of The Opera", do primeiro disco dos caras, com Adrian e Dave Murray fazendo aquela dobradinha de melodias nas guitarras e o chefão Steve Harris conduzindo as linhas de baixo.

The Trooper
(Fonte: Iron Maiden Brasil)


Muda o pano de fundo do palco. E eis que lá vem o vocalista Bruce Dickinson em sua tradicional roupa de soldado agitando a bandeira britânica para a execução de "The Trooper".

Bruce agitando a tradicional bandeira britânica
(Fonte: Iron Maiden Brasil)

Em seguida, Bruce solicitou aos presentes para que todos dessem dois passos para trás, para não esmagarem as pessoas que estavam próximas da grade do palco. Após o pedido atendido, o Iron Maiden mandou mais um de seus clássicos, "Wasted Years".

Adrian Smith e sua guitarra de dois braços
(Fonte: Iron Maiden Brasil)


A grande surpresa da noite foi a inclusão de "Rime Of The Ancient Mariner". A banda deu conta de interpretá-la em todos os seus quase 15 minutos com perfeição, considerando que trata-se de uma música bastante complexa, com variadas mudanças de andamento. Um de seus pontos altos foi Steve Harris no meio do palco encoberto pela iluminação azul durante o trecho mais progressivo e climático da música. Destaque também para Bruce Dickinson, que durante a parte instrumental fazia uma dança esquisita com uma roupa que fazia lembrar um albatroz ou um bruxo do mar. Pena os fogos de artifícios terem falhado por causa da chuva...

Bruce Dickinson e Steve Harris em "Rime Of The Ancient Mariner"
(Fonte: Iron Maiden Brasil)


Prosseguindo com grandes canções, tivemos nada menos que "Powerslave". O pano de fundo mudou para o tema da World Slavery Tour. Bruce surgiu de trás de piras de fogo que compunham o cenário vestindo uma máscara de sacerdote egípcio (tudo bem, parecia mais um pajé amazônico, mas isso não vem ao caso).

Bruce Dickinson trajado para "Powerslave"
(Fonte: Iron Maiden Brasil)

"Run To The Hills" veio para fazer os headbangers pularem novamente, seguida pela polêmica "Fear Of The Dark". Nos fóruns de discussão sobre a banda, muito se falava que essa música deveria ser cortada do set-list, por não fazer parte do período clássico no qual o repertório do show seria baseado. Ironicamente, porém, acabou sendo a música que mais levantou os presentes em Interlagos. Ninguém resistiu a fazer os seus "ôôô"s. Isso porque ninguém fazia questão dela no shows...

Dave Murray, Steve Harris e Adrian Smith fazendo o paredão sonoro do Maiden
(Fonte: Iron Maiden Brasil)

Para fechar a primeira parte do show, os clássicos "Hallowed Be Thy Name" e "Iron Maiden", está última contando com uma aparição do mascote Eddie em formato múmia, surgindo como uma esfinge ao abrir da parede da bateria. A banda agradeceu ao público e retirou-se do palco.

Guitarristas: Dave Murray e o performático Janick Gers
(Fonte: Iron Maiden Brasil)

Poucos minutos depois, o Iron Maiden retorna em grande estilo, em meio a fogos e tudo o mais para executar a polêmica "The Number Of The Beast". Em seguida, veio "The Evil That Men Do" (minha favorita). Nem preciso comentar que praticamente tive um orgasmo auditivo durante a execução dessa música. Como bônus, tivemos o Eddie em sua versão cyborg do Smoewhere In Time invadindo o palco empunhando uma pistola laser e apontando-a para o público do autódromo.

Eddie surgindo em grande estilo para "The Evil That Men Do"
(Fonte: Iron Maiden Brasil)

A música que infelizmente encerraria essa noite mágica foi "Sanctuary". No meio dela, a banda interrompeu sua execução para a apresentação dos seus integrantes. Steve Harris, um dos maiores nomes em seu instrumento, foi bastante ovacionado pelos presentes. Outro que foi bastante aplaudido foi o baterista Nicko McBrain, a quem a platéia dedicou o coro "Nicko! Nicko!". Para agradecer, ele e Bruce Dickinson fizeram uma dancinha desengonçada e pra lá de engraçada. Encerrada a música, a banda se despede definitivamente.

Parte 05 - Fuga de Interlagos

Ao final do show, o caos. Milhares de pessoas, cansadas e cheias de lama tinham a dura missão de alcançar o portão principal. Para sair era necessário percorrer de volta todo o longo circuito que foi feito alcançar o palco. Por algum motivo inexplicável, todas as saídas se afunilavam em um único portão. Eu ainda sacrifiquei minha visão da despedida da banda para poder ficar mais próximo da saída. Acabou o último acorde, utilizei o método "pernas-pra-que-te-quero" e acelerei até o portão.

As pessoas que ficaram para ver todos os momentos não tiveram a mesma sorte. Soube de pessoas que derrubaram as estruturas montadas pela organização para controlar o fluxo e de alguns mais exaltados que furaram as bexigas que a rádio Kiss FM (uma das patrocinadoras do evento) havia colocado por lá.

Alcançado o portão da saída, corri até o outro lado da avenida, peguei um táxi e fui direto para casa. Outros que demoraram a sair ainda pegaram um trânsito de nada menos que uma hora para sair da região do autódromo. Coitados! Mas se perguntar aos que foram se eles estariam dispostos a passar por todos esses problemas novamente para ver o Maiden, a resposta seria um enfático "SIM!".